Como ficam as auditorias imobiliárias com o advento da Lei nº 14.825/2024

Como ficam as auditorias imobiliárias com o advento da Lei nº 14.825/2024

A Lei nº 14.825/2024, de 20 de março de 2024, acrescentou o inciso V ao art 54 da Lei nº 13.907/2015, que passou a viger com a seguinte redação:

 Art 54. Os negócios jurídicos que tenham por fim constituir, transferir ou modificar direitos reais sobre imóveis são eficazes em relação a atos jurídicos precedentes, nas hipóteses em que não tenham sido registradas ou averbadas na matrícula do imóvel as seguintes informações: (Vigência)

(…)

V – averbação, mediante decisão judicial, de qualquer tipo de constrição judicial incidente sobre o imóvel ou sobre o patrimônio do titular do imóvel, inclusive a proveniente de ação de improbidade administrativa ou a oriunda de hipoteca judiciária. (incluído pela Lei nº 14.825/2024)

Assim como a Lei nº 14.825/2024, a Lei nº13.907/2015 (comumente conhecida como “Lei da Concentração na Matrícula”) também surgiu em decorrência de um grande esforço do legislador em aprimorar, melhorar a concentração na matrícula, ou seja, a fim de garantir maior segurança jurídica nas operações imobiliárias, de modo que todo e qualquer apontamento que interferia na transferência do Imóvel esteja averbado/registrado na matrícula (ou pelo menos deveria estar).

Esse esforço de concentração dos atos na matrícula não vem de hoje e nem aconteceu da noite para o dia, visto que o próprio Superior Tribunal de Justiça, em sua Súmula 275, dispõe que “o reconhecimento de fraude à execução depende do registro da penhora do bem alienado ou da prova da má-fé do terceiro adquirente”.

Isso porque, o Código de Processo Civil de 1973, em seu art. 593, I e II, dispunha que configurava fraude à execução o ato de alienação ou oneração de bens do devedor quando o bem for litigioso ou quando, ao tempo da alienação, correr contra o devedor, demanda capaz de reduzi-lo à insolvência. Vê-se, pois, que o referido diploma legal nada mencionou acerca da necessidade de averbação/registro de qualquer ato na matrícula do Imóvel, a fim de resguardar terceiros de boa-fé.

No entanto, o Código de processo Civil de 2015, em seu art. 792, inciso V, voltou a entender (como anteriormente previsto no inciso II do Art. 593 do CPC de 1973) que haverá fraude quando ao tempo da alienação houver ação capaz de reduzir o devedor à insolvência, senão vejamos:

Art. 792. A alienação ou a oneração de bem é considerada fraude à execução:

I – quando sobre o bem pender ação fundada em direito real ou com pretensão reipersecutória, desde que a pendência do processo tenha sido averbada no respectivo registro público, se houver;

II – quando tiver sido averbada, no registro do bem, a pendência do processo de execução, na forma do art. 828 ;

III – quando tiver sido averbado, no registro do bem, hipoteca judiciária ou outro ato de constrição judicial originário do processo onde foi arguida a fraude;

IV – quando, ao tempo da alienação ou da oneração, tramitava contra o devedor ação capaz de reduzi-lo à insolvência;

V – nos demais casos expressos em lei.

Em razão disso, a Lei nº 14.382, de 2022, incluiu o inciso IV ao Art 54 da Lei nº13.907/2015, de modo a prever que a ação que tramita em nome do devedor deveria estar averbada na matrícula, senão vejamos:

Art. 54. Os negócios jurídicos que tenham por fim constituir, transferir ou modificar direitos reais sobre imóveis são eficazes em relação a atos jurídicos precedentes, nas hipóteses em que não tenham sido registradas ou averbadas na matrícula do imóvel as seguintes informações: (Vigência)

(…)

IV – averbação, mediante decisão judicial, da existência de outro tipo de ação cujos resultados ou responsabilidade patrimonial possam reduzir seu proprietário à insolvência, nos termos do inciso IV do caput do art. 792 da Lei nº 13.105, de 16 de março de 2015 (Código de Processo Civil).   (Redação dada pela Lei nº 14.382, de 2022).

Em razão dessa alteração, alguns tribunais passaram a entender que o credor deveria averbar a ação na matrícula do imóvel objeto de discussão. Contudo, isso não significava que, a partir dessa alteração, dispensar-se-ia a realização da auditoria jurídica, uma vez que o art. 185 do Código Tributário Nacional (CTN) entende que para haver fraude à execução tributária basta haver a inscrição em dívida ativa, ou seja, não precisa da existência de uma execução fiscal, tampouco que ela esteja averbada na matrícula do imóvel:

Art. 185. Presume-se fraudulenta a alienação ou oneração de bens ou rendas, ou seu começo, por sujeito passivo em débito para com a Fazenda Pública, por crédito tributário regularmente inscrito como dívida ativa.

E, como se não bastasse o art. 185 do CTN, o Superior Tribunal de Justiça, reafirmou o entendimento de que, após a entrada em vigor da Lei Complementar 118/2005, são consideradas fraudulentas as alienações de bens do devedor posteriores à inscrição do crédito tributário na dívida ativa, a menos que ele tenha reservado quantia suficiente para o pagamento total do débito1.

Com o advento da Lei nº 14.825/2024, que acrescentou o inciso V ao Art. 54 da Lei nº 13.907/2015, deixou mais claro que se você quiser garantir o pagamento da futura condenação, independentemente de vir ao ficar ou não o vendedor insolvente, poderá ser solicitado ao juiz a averbação na matrícula daquela ação. Contudo, não podemos dizer que a referida lei trouxe grandes novidades, visto que o Art. 301 do CPC 2015 já prevê a possibilidade do juiz determinar a averbação de determinada ação na matrícula do imóvel, caso não se enquadre nos incisos I ao IV do Art 54 da Lei nº 13.097/2015. 

Por fim, é importante ressaltar que o advogado do credor poderá proteger os interesses do seu cliente da seguinte forma:

Tipo de AçãoCredor
Ação de ExecuçãoCredor deverá obter certidão de objeto e pé e averbar na matrícula do Imóvel do devedor
Ação de Repercussão PatrimonialCredor deverá solicitar autorização judicial para averbação na matrícula do Imóvel, nos termos do inciso IV do art. 54 da Lei nº 13.097/2015
Ação ReipersecutóriaAplicar-se-á o disposto no inciso I do art. 54 da Lei nº 13.097/2015
Qualquer outro tipo de ação (questões urbanísticas, ambientais etc.)Credor deverá solicitar autorização judicial para averbação na matrícula do Imóvel, nos termos do inciso V do art. 54 da Lei nº 13.097/2015

Desse modo, a despeito dos avanços na legislação acerca da concentração dos atos na matrícula, tendo em vista o disposto no CTN e entendimento do STJ, é forçoso concluir que, pelo menos por ora, ainda não tem como dispensar a realização de auditoria imobiliária.

Paola Castelano Bacharel em Direito pela Universidade Cândido Mendes- RJ, Mestranda em Direito pela Universidade do Porto- Portugal, Pós-graduanda em Negócio Jurídio e Direito Imobiliário- Ebradi; Pós-graduada em Direito Imobiliário pela Associação Brasileira de Administradora de Imóveis – RJ(Abadi); MBA em Direito Civil e Processo Civil pela Fundação Getúlio Vargas-RJ; Pós-graduada em Direito Privado Patrimonial pela Pontifícia Universidade Católica.-PUC Rio; Pós-graduada em Direito Processual Civil pela Universidade Cândido Mendes- RJ.

  1. STJ, RECURSO ESPECIAL Nº 1.141.990 – PR , de Relatoria do Ministro Luiz Fux, submetido ao rito dos recursos repetitivos, nos termos do art. 543-C do CPC e da Resolução 8/STJ, foi consolidado o entendimento segundo o qual não se aplica à execução fiscal a Súmula 375/STJ: “O reconhecimento da fraude à execução depende do registro da penhora do bem alienado ou da prova de má-fé do terceiro adquirente”.

    No RECURSO ESPECIAL – RESP Nº 1.545.032 – RS, DJe de 24/08/2015, o STJ, reafirmando o que foi assentado no julgamento do REsp 1.141.990/PR, declarou que a caracterização da má-fé do terceiro adquirente não é necessária para caracterização da fraude à execução. A natureza jurídica do crédito tributário conduz a que a simples alienação de bens pelo sujeito passivo por quantia inscrita em dívida ativa, sem a reserva de meios para quitação do débito, gere presunção absoluta de fraude à execução. No referido RESP de 2015 foi esclarecido que existe diferença de tratamento entre a fraude civil e a fraude fiscal pelo fato de que, na primeira hipótese, afronta-se interesse privado, por outro lado, na segunda, interesse público, já que o recolhimento dos tributos serve à satisfação das necessidades coletivas. A fraude à execução, diversamente da fraude contra credores, tem caráter absoluto, objetivo, dispensando a prova de que tenha havido o concilium fraudis.

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