Introdução:
Em recente decisão, o Conselho Superior da Magistratura do TJSP reafirmou a prevalência dos princípios da continuidade registral e do tempus regit actum no registro de imóveis. O caso envolveu a recusa do Oficial de Registro de Americana ao registro de uma escritura pública de compra e venda, sob a justificativa de haver ordens de indisponibilidade contra terceiros mencionados no histórico do título.
Neste artigo, explicamos o que motivou a decisão, os argumentos acolhidos pelo Tribunal e os impactos para o registro de imóveis.
Cessões extratabulares não impedem o registro
O caso envolvia uma cadeia negocial complexa. A escritura indicava que, antes da aquisição pela empresa, houve cessões de direitos feitas por terceiros não inscritos na matrícula do imóvel. O Oficial exigiu o cancelamento das indisponibilidades judiciais incidentes sobre esses cedentes para liberar o registro.
Contudo, o Tribunal afastou essa exigência com base em três fundamentos centrais:
- Princípio da continuidade: A escritura partiu da atual proprietária tabular, regularmente inscrita no registro.
- Princípio do tempus regit actum: As cessões intermediárias ocorreram antes das ordens de indisponibilidade, o que garante sua legitimidade à época dos atos.
- Irrelevância das cessões extratabulares para fins de registro: Como não foram levadas a registro, tais cessões não impactam a análise da disponibilidade tabular.
Por que a indisponibilidade não impediu o registro
A decisão destacou que as indisponibilidades só poderiam ser obstáculo ao registro se atingissem diretamente a vendedora tabular — o que não ocorreu. Além disso:
✅ As cessões ocorreram em 2016, enquanto as ordens de indisponibilidade são posteriores (a partir de 2019).
✅ A escritura foi firmada por quem constava como proprietária no registro, sem quebra da continuidade.
✅ As cessões intermediárias são citadas apenas para contextualizar a cadeia negocial, não compondo o núcleo do título submetido à qualificação.
Segurança jurídica e Registro de Imóveis
O acórdão, relatado pelo Corregedor-Geral da Justiça, Des. Francisco Loureiro, concluiu pela improcedência da dúvida registral, determinando o registro do título. Segundo o TJSP, o controle de indisponibilidades deve observar o que está efetivamente na matrícula e as condições existentes à época dos atos jurídicos.
Essa decisão fortalece a segurança jurídica no sistema registral brasileiro e evita entraves burocráticos baseados em contratos extratabulares, que não têm força para obstar registros feitos por titulares formais.
Conclusão:
A jurisprudência reforça um ponto fundamental: o registro se pauta pela matrícula, não por relações extratabulares que não foram levadas a registro. Em termos práticos:
🔹 O registrador deve respeitar os princípios da continuidade e da disponibilidade conforme o registro público.
🔹 Indisponibilidades não atingem terceiros citados incidentalmente no título, se não forem proprietários tabulares.
🔹 O princípio do tempus regit actum garante a validade de atos praticados antes de restrições supervenientes.
Essa interpretação confere previsibilidade ao mercado imobiliário e delimita o alcance da atuação dos Oficiais de Registro.
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